Cada um encontra na vida
Sua contraprestação ideal
No boteco, na clausura,
Ou rendendo-se ao capital,
A esperar no fim do mês
Que a compensação salarial
Suprima a farta amargura
De um cotidiano indesejado.
Chocolate, religião ou o suor do dinheiro guardado
Que entornará em fissura…
Um cigarro, um carro, um anel
Cocaína ou Neosaldina pra suportar a rotina
Ou apenas ter um tempo, mesmo ínfimo,
Pra contemplar estrelas no céu.
É que o sistema, companheiro de todos
Os que vivem labuta e sobrevivem prazer
Paga o quanto acha que deve
E ainda argumenta que você pode escolher
Ser “peão”, pedreiro, encanador
Motorista, gari, pintor, diarista…
Só não pode o engenheiro ser filho de faxineira
Nem o médico ou juiz ter pinta de favelado
Empresário e político? Só filho de pai abastado.
Que, é claro, pobre mesmo nem tem direito de ser feliz.
E é assim que a gente segue
E quando fuma ou se embriaga não é pra sair de si
É pra sair daqui
Dessa cidade ordenada pra que eu não possa
Tão já, deixar a periferia,
E um dia residir num condomínio no Morumbi.
Cassiana Hauer.